O caro, o barato e o tecnocrata
“O estado de bem-estar
social era muito caro”, afirmou um técnico do setor público quando discutíamos
a crise da Europa, e em particular a da Grécia. Não me tomei surpreso. Naquele
momento imaginei como Margaret Thatcher e a Escola de Chicago conseguiram difundir tão bem seus valores mundo afora entre cabeças de
tecnocratas engomadinhos. A sociedade se resume a uma planilha onde cabe apenas
o cálculo racionalizado. Mas este não é um pensamento solto ou um discurso
deslocado de certo engajamento ideológico. Não, não é. Políticas públicas de
educação, saúde, segurança e lazer ganharam ares de heresia nos tempos da
euforia neoliberal. Em nome da eficiência, o sacrossanto mercado responderia
muito bem às demandas sociais, desafogando impostos dos setores privados, que
agora poderiam efetivamente canalizar recursos em maior volume para o setor
produtivo, gerar pleno emprego em abundância e prestar serviços públicos com
eficiência e competitividade, superando a inércia do Estado. O ciclo do
capitalismo estaria perfeito e o pensamento liberal finalmente triunfaria para
todo e sempre. Mas, como diria o velho barba no século XIX, a história se
repete como farsa e depois como tragédia. Bingo! Capitais de todas as matizes e
credos ganharam um fenomenal play groud para brincar de fazer dinheiro fácil. Tudo virou aposta no que poderia ser. E não foi. A farsa novamente veio à
baila. O mesmo Estado, outrora vilão, é chamado a socorrer os cirandeiros que,
sem dinheiro, fecharam as torneiras do crédito e levaram milhares de empresas à
falência. Saiu “barato” então o Banco Central Europeu ofertar grana dos suados
impostos dos cidadãos para 523 bancos do velho continente com juros de 1% ao
ano, e com três de prazo para pagamento! Neste mês de fevereiro foram 530
bilhões de euros para que a garotada da ciranda que se estrepou na brincadeira
se recuperasse do tombo. Isso depois deles torrarem o dinheiro da previdência
de milhões de pessoas e passarem o porrete em outros milhões de
correntistas e pequenos investidores. O estado de bem-estar social das elites
do planeta é realmente muito caro. Mas esta não é uma conta a ser feita pelo
nosso técnico. Agora são milhões a vagar pelas ruas das cidades
européias à busca dos empregos e dos sonhos roubados. E a “reorganização” do
sistema traz consigo uma saraivada de retóricas amplificadas pelas corporações
de mídia para garantir legitimidade “técnica” às medidas fiscais
salvacionistas. Estão aí para não me deixar mentir a moçada da CNN, do
Financial Times e da Globo, como Miriam Leitão, Carlos Alberto Sardemberg e cia. Essa turma é
boa nesse negócio de enganar trouxa. E no lombo da população européia cairá o
chicote do aumento dos impostos, da redução dos salários e do aniquilamento da
blindagem social que ainda restava. Adeus escola e saúde públicas. E o Estado
passa a ser reduzido a um mero gerente do clube do bolinha da ciranda, que
ficará de “castigo” um tempinho pela traquinagem enquanto aguarda que o parque
seja rearrumado para a brincadeira prosseguir com mais segurança. Realmente, o
estado de bem-estar social do capital é muito caro, não é mesmo meu caro
técnico?
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