A utopia do Bhagwan. Ou um capitalismo pra chamar de seu
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Seita? Filosofia de vida? Terapias coletivas?
Dissidência do sistema? Rebeldia para com os valores morais do Ocidente? Fuga
existencial? Fanatismo religioso? Wild
Wild Country, série documental da Netflix sobre a passagem do guru indiano
Bhagwan Shree Rajneesh, o Osho, pelo estado do Oregon, nos EUA, traz à baila estas
e outras questões que envolveram o polêmico líder espiritual.
O filme, que passou a ser ofertado sem maiores
estardalhaços pelo serviço de streaming
estadunidense, é, até o momento, uma das melhores produções da empresa, que nem
sempre é feliz no que produz, haja vista a bizarra série-panfleto "O
Mecanismo", entre outras.
Contando com depoimentos contundentes e esclarecedores,
inclusive os da chefa do estado maior do Bhagwan, Ma Anand Sheela, o documentário mergulha em situações
recônditas da experiência do guru e de alguns dos seus milhares de discípulos
nas terras do Tio Sam.
Projeto audacioso. Construir infraestrutura
para uma comunidade com mais de 10 mil pessoas na região de Antelope, minúscula
e pacata cidade habitada por 40 cidadãos, a maioria aposentados. Grupo de
hábitos conservadores que, de repente, viu a invasão de milhares de seguidores
apaixonados pelo místico hindu que para lá peregrinaram afim de praticar
variadas técnicas de meditação, buscar conforto existencial e uma vida sem
amarras para o sexo livre e relações abertas.
Desde que iniciara seu trabalho na Índia, na
cidade de Ponna, nos meados dos 70, o Osho acenara com conforto espiritual
àqueles que transitavam entre os embalos da contracultura e a abundância de uma
vida material recém conquistada. Jovens milionários yuppies dos grandes centros
da Europa e EUA buscavam um capitalismo para chamar de seu. E o Bhagwan lhes apresentava
o modelo social para tal.
O Ashram do guru era o shangrila perfeito. O
Nirvana estava ali. Para mestre e discípulos. Os endinheirados seguidores do
Osho doavam vultuosas quantias ao mestre e este lhes retribuía com a libertação
do cativeiro mental da sociedade de consumo. Não precisavam se desfazer das
suas riquezas, bastava investi-las na utopia coletiva e seletiva que o guru
prometia, além de muita kundalini e gritos tribais catárticos
para exorcizar fantasmas psíquicos.
O cerco apertou na Índia e o Osho, pondo Sheela no
comando das operações, migrou para os EUA onde uma fundação que lá criara já havia
comprado milhares de hectares no estado do Oregon, precisamente no condado de
Wasco. Amparado pelo Constituição dos EUA, que assegura liberdade religiosa, o
projeto, de início, encontrou todas as facilidades.
O empreendimento ergueu prédios, casas, construiu
diques, dinamizou a agricultura, constituiu uma economia com moeda própria e, de alguma maneira, modificou a paisagem da
localidade. Não apenas geográfica, mas também humana. Os discípulos, a maioria
estadunidenses, vestiam roupas vermelhas e alaranjadas e andavam aos bandos
entre gargalhadas, beijos e carícias. Hábitos que passaram a incomodar os
moradores de Antelope.
Oposição de conservadores não só do Oregon como de
todo o país e as previsíveis dissensões internas entre os sannyasis, assim
chamados os discípulos do Bhagwan, foram fatores que determinaram o início do
fim da utopia no Oregon.
A comuna passa a registrar conflitos internos e os
órgãos de controle dos EUA apontam lupas sobre as atividades da fundação. Rajneeshpuram, como a comuna fora denominada,
representou o sonho que para milhares ainda não acabou desde que o Osho
faleceu em condições misteriosas, em 19 de janeiro de 1990, em Poona, na Índia.
O documentário tem roteiro extremamente bem escrito e conta com vasto arquivo e depoimentos de personagens que amaram e odiaram Bhagwan Shree Rajneesh. O amor e o ódio que o próprio guru afirmava não haver fronteira. Aliás, sua trajetória e a de muitos dos seus seguidores são exemplos dessa mescla.
O documentário tem roteiro extremamente bem escrito e conta com vasto arquivo e depoimentos de personagens que amaram e odiaram Bhagwan Shree Rajneesh. O amor e o ódio que o próprio guru afirmava não haver fronteira. Aliás, sua trajetória e a de muitos dos seus seguidores são exemplos dessa mescla.
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