O Clad e a política na América latina




Nesta terça-feira (27) será aberto em Salvador o XIV Congresso Internacional do Centro Latino-Americano para o Desenvolvimento (CLAD). O tema do evento, que contará com representações técnicas e autoridades de 22 países, será a Reforma do Estado e a Administração Pública. O CLAD ocorre num momento especial da América Latina, quando a agenda política da região é marcada pela disputa da hegemonia entre as forças que se identificam com o passado, explicitamente neoliberal, e com o presente, pós-neoliberal. Os rompimentos com o antigo modelo vão ganhando contornos mais amplos, mediante o fortalecimento do papel dos estados nacionais e o crescimento dos movimentos sociais. Brasil, Argentina, Venezuela, Cuba, Equador, El Salvador, Nicarágua, Bolívia, Paraguai e, tudo indica, o Uruguai – as eleições ocorrem neste domingo e existe a possibilidade do candidato José Mojica, da Frente Ampla, ser eleito presidente - são países nos quais essa disputa se coloca de forma mais enfática. Não sem razão que o linguista e intelectual dissidente norte-americano Naom Chomsky declarou recentemente que "América Latina é hoje o lugar mais estimulante do mundo". O continente soergue-se. O ciclo neoliberal que está sendo superado vitimou os estados com violentas crises de dívidas que culminaram com empréstimos e cartas de intenções ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Os estados foram esfacelados e enfraquecidos, debelando as políticas sociais sob a batuta hegemônica do capital financeiro, o que resultou em forte retração do desenvolvimento econômico. Os chamados ajustes fiscais e os “choques de gestão” amputaram a capacidade de articulação do setor público. Tais medidas comprometeram desde a prestação dos serviços à sociedade – saúde e educação em destaque - a atuação dos governos como fomentadores da economia. A América Latina ficou refém dos experimentos neoliberais e, no Brasil, o governo de Fernando Henrique Cardoso levou o país a duas vigorosas crises econômicas, terminando por quebrar o Brasil. Mas as mudanças registradas a partir do final dos anos 90, tendo início na Venezuela e posteriormente se espalhando como rastilho de pólvora pela maioria dos países do continente, impuseram uma inflexão nesse itinerário. No CLAD, várias destas experiências que se processam no continente serão apresentadas. No entendimento do cientista político Emir Sader, o que unifica a gestão pública da maior parte dos governos latinoamericanos “é a reunião de dois aspectos comuns: a opção pelos processos de integração regional ao invés dos Tratados de Livre Comércio e a prioridade das políticas sociais”. Ainda de acordo com Sader, “são os dois pontos de maior fragilidade dos governos neoliberais, cuja lógica de abertura das economias privilegiou o livre comércio e os Tratados de Livre Comércio com os Estados Unidos”. Com a prioridade nos ajustes fiscais e na estabilidade monetária, as políticas sociais foram relegadas à milésima posição. Neste novo panorama político-econômico as políticas sociais ganham maior dimensão, ainda que longo caminho deva ser trilhado para atender as crescentes e urgentes demandas das sociedades nesses países. No caso do Governo do Brasil, o conceito de qualificação do gasto, por exemplo, tem assumido a agenda da gestão pública num antinômio direto ao antigo receituário de cortes sistemáticos do gasto público, que entende o Estado apenas como articulador dos interesses privados; opta-se pelo setor público a serviço do desenvolvimento econômico sustentável e perpetrador da distribuição de renda. E neste embate este segundo caminho vai ocupando mais espaços na América Latina. Que assim seja.

Comentários

Ontem tive a oportunidade de dissecar com um pouco mais de profundidade a mudança na política econômica no Brasil, que, sob ditames semelhantes aos ditames de Lenin, pôe a vontade política como a condutora dos processos econômicos. Infelizmente, como o companheiro constatou recentemente, ainda existe muita gente remando a favor da idéia mascarada da eficiênca e da competência, tentando impor a lógica técnica perante a lógica contextual das necessárias políticas sociais. Zeca, temos que entrelaçar melhor as nossas concepções e compartilhar mais idéias. Sei dos seus afazeres e tudo mais...encarecidamente...você apresenta em cada texto que publica neste site uma bibliografia que preciso estudar, mas, estou sem qualquer roteiro de leitura. Atualmente, estou relendo obras importantes da sociologia, mas, quero retomar os meus estudos sobre a política simbólico e a política da comunicação...enfim...peço auxílio e um roteiro bibliográfico...de companheiro para companheiro...
Sócrates

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