Nádia Lapa e sua antropofagia militante
Militância feminista por afirmação sexual e libelo existencial. Advogada, jornalista e blogueira, Nádia Lapa narra suas aventuras e desventuras sexuais e amorosas sem apelos. E também sem pudores. Cem homens em um ano não se limita à literatura erótica. É punho cerrado adocicado por gozos e sussurros que usa as mesmas armas de uma sociedade falocentrica para contrapô-la. Se for legítima a vontade de variar parceiros, que assim seja. O recado é direto. A contestação também.
Transas pra lá de gostosas, sexo mecânico e sem graça, despedidas insólitas, paixonites desconcertantes, amores não vingados, detalhes de posições e corpos, ménages, tórridas atrações fatais, que se encerram no ato, a “pegada” perfeita, alegrias e frustrações.
É como se Nádia estivesse numa roda de amigas e amigos papeando. E o faz com narrativa e textos primorosos. Dirige-se a todos que queiram entender o comportamento de uma mulher madura que não se furta de viver plenamente sua sexualidade. Em tempos de ficções banais de variados tons de cinza, Nádia Lapa, ou Letícia Fernandez, pseudônimo assumido no seu blog Cem homens, desconcerta e derruba tabus. E por dar a face ao público, também sofre as consequências.
O livro, lançamento da Matrix, edição em 141 páginas, não narra encontros com os ditos 100 homens. São 35 aventuras, 38 homens contando situações onde mais de um foi partícipe. Foram estes os escolhidos por Nádia para figurarem nas suas narrativas, todas transpostas do blog.
“Transei e narrei porque gosto de fazer ambos. E, afinal de contas, eram decisões sobre meu corpo e o meu tempo. Por qual razão isso deveria incomodar pessoas que nunca me viram? Fui boba de achar que tudo era tão fácil de entender. O que o outro faz com o próprio corpo não deve ser problema da coletividade. Mas muita, muita gente pensa o contrário”.
O desabafo da escritora serve como catarse à avalanche de ofensas que recebe, seja pelo seu físico de gordinha ou mesmo porque assume sua opção libertária. Como ela afirma, “eu era a Geni”. E para muitos, ainda é.
Bom seria ver um papo entre Nádia Lapa e William Reich, o psicanalista alemão que ela cita no final do livro. O autor de Psicologia de massas do fascismo, profundo estudo sobre a repressão à energia sexual na Alemanha nazista, poderia estar diante de um depoimento que o deixaria feliz.
“Traçar” 100 mancebos num ano serve como símbolo de afirmação. Nádia Lapa faz antropafogia simbólica. Devora e mastiga machos, por vontade e prazer. E, de alguma forma, por opção política.
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