A crise dos cartões corporativos ou o desmonte do Estado?



Enquanto o Estado brasileiro focar sua atuação, ainda que com todas as contradições e limitações, em políticas sociais que dependam do fortalecimento das suas estruturas administrativas, a direita tupiniquim não recuará um milímetro do seu objetivo de desestabilizá-lo. Mais uma crise emerge e a bola da vez são os cartões corporativos. No entanto, a atual campanha perpetrada pelo centro oposicionista (PSDB-DEM) em parceria com a grande mídia acerca dos gastos com os cartões já se embaraça nas próprias pernas. Com habilidade, a base aliada do governo se antecipou e pediu a instauração de uma CPI no Senado. A oposição só aceitaria se a comissão fosse mista (integrando parlamentares do Senado e Câmara). A base do governo aceitou condicionando que a investigação remontasse ao ano de 1998, passando a averiguar, portanto, as despesas das contas B do governo de Fernando Henrique Cardoso, que deram origem ao cartão corporativo, implantado em 2001 ainda na sua gestão. A decisão melindrou as hostes oposicionistas, onde expressivos quadros temem sobremaneira uma rígida apuração das contas do ex-presidente. Enquanto isso, os critérios de noticiabilidade com o fato são tratados ao sabor dos meios de comunicação. Como carnavalizar uma situação na qual o tiro pode sair pela culatra, ou pior, atingir o próprio pé? E o primeiro ensaio já ocorreu. A Folha de São Paulo noticiou que os gastos com o cartão corporativo no governo de José Serra (PSDB) atingiram a cifra de R$ 108 milhões, volume maior do que as despesas com os cartões no governo Lula ao longo de mais de cinco anos. Hilário, o jornalista Paulo Henrique Amorim carimbou o fogo amigo da família Frias de “Tapioca do Serra”, numa alusão à compra de tapioca com o cartão por parte do ministro dos Esportes, Orlando Silva, que serviu de gancho para pautas na revistas Veja e Época, e na própria Folha de São Paulo, entre outros órgãos da grande imprensa. Saindo do varejo factóide e adentrando à análise mais crítica da situação midiopolítica do Brasil, tem-se o jogo do poder no mais claro conceito da disputa hegemônica. Retomando a questão do Estado, é óbvio que o alvo é o seu desmonte, e rápido! Mesmo com uma política econômica inofensiva aos interesses dos grandes bancos e corporações, o exemplo é malévolo para as elites nacionais, que não se conformam com as políticas públicas de transferência de renda. A derrota da CPMF é um exemplo. O cenário que a direita constrói sustenta-se em pilares argumentativos sob diversos discursos perpetrados na mídia, seja no texto de Agnaldo Silva, na novela Duas Caras, da Globo, ou na capa da revista Veja. O escriba da classe média, por exemplo, defenestra o movimento estudantil e combate a política de cotas raciais a partir de uma ácida crítica às universidades públicas que adotaram a medida. Na trama, uma universidade privada apresenta-se como solução para os problemas educacionais do país, enquanto o samba-enredo da imaginária Portelinha chama o governo federal de circo. No mesmo front, a Veja abre capa com a foto de um marajá sob um tapete voador, estrela vermelha no turbante, que representa a administração pública. Uma leitura mais apurada aponta, indubitavelmente, à tentativa da retomada rápida da agenda ultraneoliberal. O projeto é o Estado diminuto, enfraquecido, e que apenas sirva de agência de fomento aos interesses privados. No mais, eleições como disputas de marketing para ornar com pinta de “democracia” o intento real: o sucateamento da máquina pública. Petrobrás, Caixa Econômica, Banco do Brasil e outras estatais estarão então sob forte ameaça, assim como de resto todos os programas sociais e a blindagem de segurança social-trabalhista que ainda resta ao povo brasileiro, sempre condenado a ser escravo de uma elite torpe e atrasada.

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