O adeus do doce anarquista
Um maravilhoso anarquista. Todas as trincheiras da luta pela liberdade perderam, na última sexta-feira, dia 23, o médico, terapeuta, escritor, dramaturgo e roteirista Roberto Freire. Autor de 25 livros, entre eles Cléo e Daniel, Sem Tesão Não Há Solução, Ame e dê Vexame, Coiote e Eu e um outro, Roberto Freire, o bigode, foi seguramente um dos maiores intelectuais desse país. Para a televisão, escreveu a Grande Família e TV Mulher. Certamente que a repercussão da sua morte não teve o destaque merecido. Freire era uma espécie de bad boy entre os círculos mais letrados do país, à direita e à esquerda. Ainda lembro quando tive o primeiro e único contato com o terapeuta aqui em Salvador. O ano era 1989. Fui convidado a conhecer um bar diferente, o Tesão e Cia, nas imediações da Praia de Jaguaribe. Era, na verdade, uma cooperativa de jovens que nos finais de semana trabalhava com o bar e no restante dos dias oferecia terapias de grupo. Encantei-me pelo trabalho, ainda que polemizando. Para um militante à época da esquerda ortodoxa, aquilo tudo poderia ser uma grande blasfêmia. Mas assumo que capitulei diante dos argumentos daquele “coroa”. Roberto Freire me apontou caminhos de transformação social que eu jamais vislumbrara. E quem foi ele? Livre militante das suas idéias, o médico Roberto Freire realizou sua formação em Psicanálise através da Sociedade Brasileira de Psicanálise. Posteriormente, ele rompeu com a prática psicanalítica e se aproximou da obra do terapeuta alemão William Reich (A Análise do Caráter e Psicologia de Massas do Fascismo, entre outras obras), que trabalhou com a bioenergética nos anos 20 e 30 e morreu nos cárceres nazistas na década de 40. A partir da teoria reichiniana, Roberto Freire desenvolveu a proposta da terapia anarquista, a somaterapia, uma prática que buscasse liberar as potencialidades do ser humano. Diz o terapeuta: “A pessoa saudável é aquela que vive sua originalidade, se auto-regulando e buscando sua unicidade. Essa seria a finalidade biológica de cada vida. Toda vez que alguém não consegue expressar sua originalidade, a nossa espécie e o ecossistema em que vivemos perdem uma contribuição ao seu desenvolvimento, tornando-se, então, essa vida uma experiência inútil”. A partir dos meados dos anos 80, como uma espécie de lanterna na ressaca do regime militar, Roberto Freire iniciou a construção da rede somateráptica país afora. Dezenas de núcleos de terapias da soma foram implantados em diversas cidades. De acordo com o site oficial da somaterapia, o trabalho desenvolvido por Freire se dá, “através de exercícios teatrais, jogos lúdicos e de sensibilização (...) criando uma série de vivências que possibilitam uma rica descoberta sobre o comportamento, suas infinitas e singulares diferenças”. A preocupação da somaterapia é perceber como o corpo reage diante de situações comuns no cotidiano das relações humanas, como a agressividade, a comunicação, a sensualidade e sua associação com os sentimentos e emoções. O objetivo é criar um contraponto à massificação. A Soma passou a se constituir então como um processo terapêutico com conteúdo ideológico explícito, o Anarquismo. Vida longa a Roberto Freire, que seus frutos proliferem.
Comentários
Fui sua aluna na FJA, e gostaria de te entrevistar para uma matéria sobre as perspectivas políticas da sucessão para a prefeitura de Salvador.
vc pode me ajudar?
meu e-mail é julianalaxon@hotmail.com
bjs,
Wilhelm Reich(Psicanalista austríaco)
Nascimento: 24/3/1897, Dobryzcynica, Áustria (hoje parte da Polônia)
Morte: 3/11/1957, Lewisburg, EUA
"A vida brota de milhares de fontes vibrantes, entrega-se a todos que a agarram, recusa-se a ser expressa em frases tediosas, aceita apenas as ações transparentes, as palavras verdadeiras e o prazer do amor." Com mensagens como essa, Reich, teórico controvertido, conquistou seguidores no mundo inteiro.
Wilhelm Reich vinha de uma família de judeus não-praticantes. Foi educado em casa até os 13 anos, quando a mãe suicidou-se. Três anos depois, perdeu o pai. Em seguida, durante a Primeira Guerra Mundial, teve a casa invadida pelo Exército russo. Depois, alistou-se no Exército austríaco, chegando ao posto de tenente.
Em 1918, com o fim da guerra, matriculou-se na Universidade de Viena para estudar medicina. Em 1920, foi aceito pela Sociedade Psicanalítica de Viena, sob o comando de Sigmund Freud. Dois anos depois, tornou-se médico.
Entre 1922 e 1924, estudou neuropsiquiatria no Hospital Universitário de Viena, com o professor Wagner Jauregg (que depois ganharia um Prêmio Nobel de Medicina).
Em 1922, casou com uma assistente, Annie Pink (eles teriam duas filhas).
Em 1927, publicou "A Função do Orgasmo" e, dois anos depois, "Materialismo Dialético e Psicanálise". Mudou-se para Berlim em 1930. Naquela cidade, ingressou no Partido Comunista Alemão (do qual seria expulso em 1933).
Nos anos 1930, afirmou ter descoberto o "orgônio", a substância vital presente na energia sexual. Em 1932, separou-se de Annie e passou a viver com a bailarina Elsa Lindeber. No ano seguinte, publicou "Análise do Caráter" e "Psicologia de Massas do Fascismo". Então, fugindo do nazismo e da perseguição aos judeus, foi morar e trabalhar na Escandinávia.
Em 1934, determinado a descobrir a materialidade da libido, a energia sexual, passou a desenvolver o projeto "Bions". No ano seguinte, em Oslo (Noruega), realizou pesquisas no Instituto de Biofísica e proferiu palestras na Universidade.
Em 1939, separou-se de Elsa e foi viver com Ilse Ollendor (os dois teriam um filho). No mesmo ano, mudou-se para os EUA.
Em Nova York, trabalhou como professor associado de psicologia clínica na New School for Social Research. Criou uma máquina, o "acumulador de orgônio". Em 1941, o FBI o prendeu por atividades subversivas.
Mudou-se para o estado do Maine em 1944 e construiu ali uma casa, dando-lhe o nome "Orgonon". O FBI então investigou o tal acumulador de orgônio, e Reich precisou defender-se nos tribunais.
Em 1948, seus seguidores criaram a Fundação Wilhelm Reich, para preservar o pensamento, as atividades e as obras do psicanalista. Entre aquele ano e 1957, Reich foi perseguido pela FDA (a agência do governo americano que regula gêneros alimentícios e medicamentosos), sendo acusado de fraude. Em 1957, foi condenado a dois anos de prisão e teve todas as suas obras proibidas. Em dezembro do mesmo ano, um ataque cardíaco o matou na prisão.
Obrigado pela brilhanmte intervenção. Você está certo!