A disputa iniciada em 2002 estará em curso em 2010

O que está em jogo nas próximas eleições? O disparo da resposta não pode, nem deve, repousar no roçado do varejo, ultimamente permeado por factóides e ilações construídas sob o calor do processo sucessório que se aproxima. O desespero da oposição da a medida da disputa. O pipocar de escândalos que se esvaiam como balas de festim, provenientes de velhas pautas requentadas pela mídia, tem o claro intento de buscar desestabilizar a candidatura do Palácio do Planalto. O que torna então acirrada a disputa iniciada em 2002 e que prossegue em curso este ano? Os dois projetos majoritários não são iguais, ainda que muitos analistas, inclusive à esquerda da candidatura de Dilma Roussef, teimem em afirmar que sim. Um olhar mais aguçado sobre o panorama descortinará de forma mais clara este palco. Não, não é apenas o debate acerca do tamanho do Estado, a expansão das políticas sociais e afirmativas e o encetamento de um Plano Nacional de Direitos Humanos que tem despertado o ódio e a movimentação da oposição. Não são apenas estes os pomos da discórdia. Mira-se o longo prazo com o bastão cravado no presente. Explico. Quem pôde acompanhar as discussões envolvendo o tal Fórum Democracia e Liberdade de Expressão, patrocinado pelo Instituto Millenium, não precisou se esforçar muito para entender os recados dados pelo alto baronato empresarial-midiático por intermédio dos seus funcionários. O eixo ideológico que permeou os seminários e mesas foi centrado na preocupação de um possível processo de socialização em andamento no país, tendo como ator principal o PT. Traduzindo: o que manifestamente é temido por eles é o início da perda, de fato, do processo hegemônico na sua totalidade. Como assim, já que o atual projeto se encontra a oito anos no poder? O problema é que nem sempre estar no poder significa deter a hegemonia na sua plenitude. A construção de um campo de legitimidade política não depende apenas do acesso ao aparelho de Estado. Sua consolidação vai depender, sobretudo, dos espaços que se ocupa na sociedade no sentido de tecer a construção de teias sociais, culturais e econômicas capazes de não só dar sustentação ao referido projeto, mas potencializá-lo como alternativa real de poder. E, para tal, o Estado pode ser ou não ferramenta fundamental. O que vem ocorrendo no país é o encetamento da primeira alternativa. Em oito anos cerca de 35 milhões de pessoas passaram à linha de consumo, ampliando a chamada classe C, e mais 29 milhões ingressaram nos estratos médios. Portanto, estar-se-á diante de cerca de 65 milhões de brasileiros, sem contar outros tantos milhões de dependentes destes, que melhoraram de vida nos últimos oito anos - mais universitários, mais trabalhadores melhor remunerados, mais gente se alimentando melhor e também com mais opções de acesso ao lazer e entretenimento. É este o contingente da população que tem o Estado como co-participe de uma marcha pela ampliação de direitos sociais e ações afirmativas com progressiva distribuição de renda – ainda que com muitas limitações pontuais em decorrência das nuances políticas. Estes grupos não aceitarão retrocessos. Ao contrário. Passarão a exigir que tais políticas públicas sejam cada vez mais abrangentes e contínuas, radicalizando-as. Trata-se de um gradiente de politização que também se materializa no incremento e na diversidade dos movimentos sociais. Portanto, estancar o curso desta corrente foi a tarefa assumida pela agenda oposicionista. O evento promovido pelo Instituto Millenium é emblemático para atestar este intento, uma vez que no mesmo foram rechaçadas todas e quaisquer proposições que visem o fortalecimento das organizações da sociedade e o implemento de marcos regulatórios sobre a economia, inclusive para o setor da mídia. Não à toa que os segmentos corporativos dos meios de comunicação têm misturado conceitos de liberalismo econômico com liberdade de expressão nos seus argumentos ideológicos, como se ambos tivessem o mesmo sentido. É uma estratégia cujo desfecho pode incorrer em situações não aceitáveis, a médio e longo prazo, para segmentos da sociedade que sempre impediram a mudança do quadro social, seja por intermédio de um golpe de Estado, como ocorreu em 1964, ou pelas tramas em curso com o propósito de alcançar a legitimidade nas urnas, possibilidade que tem se tornado distante ante o desfibramento da candidatura da oposição.

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