Neguinho do Samba não foi notícia na Globo




Não, Neguinho do Samba não foi apenas um figurante nos clipes de Michael Jackson e Paul Simon. O baiano Antonio Luis Alves de Souza, um dos mestres da MPB e criador da batida do samba-reggae, foi um dos músicos mais criativos e geniais do país e já tem seu nome garantido no roll dos melhores do mundo. Falecido no último dia 31, sábado, Neguinho, completos 54 anos, foi enterrado em Salvador na tarde de terça-feira desta semana numa comovente cerimônia. Mesmo assim, o mestre e educador de centenas de crianças, às quais ajudava a ter um futuro mais digno e cidadão, não foi pauta no Jornal Nacional no dia do seu enterro. A Rede Globo se omitiu em noticiar a cerimônia fúnebre do mestre do Pelourinho no seu jornal de horário mais nobre. O fato expõe um problema da mídia corporativa brasileira: o olhar para o próprio umbigo. Ou seja, as ocorrências do centro-sul do Brasil sempre ganham relevância, por mais inexpressivas que sejam. Os critérios noticiosos que deveriam permear uma emissora que trabalha em rede nacional são jogados às favas. E, penso, o episódio deve ter constrangido até mesmo sua emissora afiliada local, se este foi o caso, já que a mesma “vende” fácil pautas que induzam a um ângulo meramente político a desconstrução simbólica da Bahia. Neguinho do Samba não foi matéria, mas um assalto a uma pousada na ilha de Vera Cruz é. Erro de origem. No Brasil, as chamadas cadeias nacionais de comunicação deveriam mudar o nome para cadeias comerciais de retransmissão de produtos, apenas. Uma relação de colonizador e colonizado, e com uma variável etnocêntrica. Só para lembrar, no dia 03/11 a emissora do Jardim Botânico deu destaque à morte do antropólogo Claude Lévi-Strauss, aquele que participou da fundação da USP, que taxou a Baía de Guanabara de “boca banguela” e publicou o livro Tristes Trópicos, fruto de pesquisas com nações indígenas do Norte do país. Não desmerecendo a importância e o respeito a Strauss, o interessante é que o valor-notícia da emissora dos Marinhos não se atentou ao fato de que Neguinho do Samba e Lévi-Strauss coordenavam perfeitamente como informação, já que o primeiro faz parte do imaginário e da cultura imaterial que o antropólogo francês tanto escarafunchou neste Brasil. A obra de Neguinho do Samba era um dos itens da própria representação do seu objeto. Quanto é lamentável um Jornalismo movido por um olhar míope, preconceituoso e de profunda ignorância. Que tristes trópicos!

Comentários

Iracema Chequer disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
Iracema Chequer disse…
Muito bom o texto amor!

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