Brown bota a boca no trombone
A palavra apartheid (separação) tem ganho a agenda do Carnaval de Salvador nos últimos 10 anos. Na festa desse ano a polêmica envolveu três artistas da terra: Caetano Veloso, Gilberto Gil e Carlinhos Brown. O pomo da discórdia é a comercialização e a conseqüente privatização acelerada do espaço público do circuito momesco de Salvador. Brown colocou um bloco nas ruas sem corda, o Pipocão, e exigiu mais democracia na folia soteropolitana. "O Carnaval é uma festa do povo para o povo e que, aos poucos, está sendo desfigurada pela ganância de empresários", afirmou Carlinhos Brown ao jornal Folha de São Paulo. O “mano” Caetano, expertise em polêmicas do tipo pirraça, retrucou: "não penso em cordão como apartheid. Cordão é sinônimo de bloco. A palavra [cordão] foi criada justamente por causa deles [os blocos] (...) Sempre houve cordão em torno dos blocos". Mais sensato, o ministro da Cultura Gilberto Gil, que todos os anos disponibiliza um trio elétrico gratuito para os foliões, o Expresso 2222, completou a tríade da polêmica: "o Carnaval é um momento em que essas questões são suspensas, porque o negro é quem faz o Carnaval, que tem esse poder, está autorizado a exercer historicamente esse poder”.
A questão em si não deve se limitar a ter ou não corda nos blocos, isso é secundário. Nos idos dos anos 70 e 80 os blocos carnavalescos em Salvador eram associações de pessoas que se conheciam ou passavam a se conhecer através de amigos comuns. Assim eram os blocos populares, os da classe média e média-alta e até mesmo de intelectuais, artistas e escritores. Todos tinham cordas. Claro, o Carnaval não sepultava as contradições sociais, estas permaneciam e eram evidentes ao longo da folia, todavia existia, sim, a participação popular mais autêntica. Organizar um bloco era um fator de sociabilidade durante o ano, em diversos sentidos.
À medida que a música tocada em cima dos trios elétricos passou a ser alvo de intensa veiculação, leia-se o fenômeno da indústria do Axé Music, os artistas que as interpretavam passaram a “dourar a pílula” desses blocos. A partir daí, aqueles que se destacavam eram contratados pelas agremiações que então cobravam mais pelo fato de ter os artistas de melhor qualidade em seus trios.
Essa é a raiz da crescente exclusão e não há como negar. Quem não se lembra da Banda Scorpius? Aquela mesma que animava os bailes de domingo à tarde no antigo Clube Costa Azul, de aprazíveis carnavais de salão, hoje é a Chiclete com Banana e seus integrantes são artistas milionários. No entanto, se contabilizarmos quantos desses artistas que já produziram para a folia baiana se “deram bem” em meio à selva empresarial que se formou em torno da festa, veremos que são poucos se comparados à quantidade desses compositores e cantores que figuraram para a história quase que no anonimato.
O cerne da questão está centrado na forma de empresariamento. Ter que organizá-la é uma realidade inconteste, afinal de contas não dá para colocar mais de um milhão de pessoas nas ruas sem planejamento. Todavia, o que se prescinde é de uma atuação mais enfática do poder público para garantir a democratização e a participação popular. O Galo da Madrugada, que sai no sábado de Carnaval no Recife, considerado o maior bloco do mundo, é um exemplo de ampla participação, assim como a experiência do circuito Batatinha no Pelourinho, em Salvador.
Evidentemente que uma mudança de curso na programação da folia vai mexer com interesses milionários que pairam sobre a mesma. Mas interesses terão que ser atingidos de alguma forma para que prevaleça o interesse maior, o da população. Os chamados circuitos principais não devem ser exclusivos dos blocos para turistas abonados ladeados por camarotes de personalidades. Há que se contemporizar esse espaço entre aqueles que assistem e se deleitam no ar-condicionado, ou mesmo no asfalto privatizado, e o verdadeiro protagonista da festa que é o povo de Salvador, de onde surgem as composições que animam todos os anos as multidões e servem como combustível para enriquecer uma meia dúzia de pessoas. É compreensível o desabafo de Brown.
A questão em si não deve se limitar a ter ou não corda nos blocos, isso é secundário. Nos idos dos anos 70 e 80 os blocos carnavalescos em Salvador eram associações de pessoas que se conheciam ou passavam a se conhecer através de amigos comuns. Assim eram os blocos populares, os da classe média e média-alta e até mesmo de intelectuais, artistas e escritores. Todos tinham cordas. Claro, o Carnaval não sepultava as contradições sociais, estas permaneciam e eram evidentes ao longo da folia, todavia existia, sim, a participação popular mais autêntica. Organizar um bloco era um fator de sociabilidade durante o ano, em diversos sentidos.
À medida que a música tocada em cima dos trios elétricos passou a ser alvo de intensa veiculação, leia-se o fenômeno da indústria do Axé Music, os artistas que as interpretavam passaram a “dourar a pílula” desses blocos. A partir daí, aqueles que se destacavam eram contratados pelas agremiações que então cobravam mais pelo fato de ter os artistas de melhor qualidade em seus trios.
Essa é a raiz da crescente exclusão e não há como negar. Quem não se lembra da Banda Scorpius? Aquela mesma que animava os bailes de domingo à tarde no antigo Clube Costa Azul, de aprazíveis carnavais de salão, hoje é a Chiclete com Banana e seus integrantes são artistas milionários. No entanto, se contabilizarmos quantos desses artistas que já produziram para a folia baiana se “deram bem” em meio à selva empresarial que se formou em torno da festa, veremos que são poucos se comparados à quantidade desses compositores e cantores que figuraram para a história quase que no anonimato.
O cerne da questão está centrado na forma de empresariamento. Ter que organizá-la é uma realidade inconteste, afinal de contas não dá para colocar mais de um milhão de pessoas nas ruas sem planejamento. Todavia, o que se prescinde é de uma atuação mais enfática do poder público para garantir a democratização e a participação popular. O Galo da Madrugada, que sai no sábado de Carnaval no Recife, considerado o maior bloco do mundo, é um exemplo de ampla participação, assim como a experiência do circuito Batatinha no Pelourinho, em Salvador.
Evidentemente que uma mudança de curso na programação da folia vai mexer com interesses milionários que pairam sobre a mesma. Mas interesses terão que ser atingidos de alguma forma para que prevaleça o interesse maior, o da população. Os chamados circuitos principais não devem ser exclusivos dos blocos para turistas abonados ladeados por camarotes de personalidades. Há que se contemporizar esse espaço entre aqueles que assistem e se deleitam no ar-condicionado, ou mesmo no asfalto privatizado, e o verdadeiro protagonista da festa que é o povo de Salvador, de onde surgem as composições que animam todos os anos as multidões e servem como combustível para enriquecer uma meia dúzia de pessoas. É compreensível o desabafo de Brown.
Comentários
Grande abraço,
Guto.
Grégoire
http://calangonaparede.blogspot.com
Foram 36 bandas e nenhuma ocorrência de maior gravidade. Mas, como sempre, faltou a consideração da prefeitura. A empresa que obteve a licitação para a parte sonora do Palco do ROck fez uma tremenda lambança, atrasando o início dos shows em quase uma hora. Foi preciso jogo de cintura para contornar a situação. No mais, professor, 4 noites de muito rock and roll, com destaques para Bruno Nunes, Metropolis, Templarius, Aqueronte, Playground, Pastel de Miolos, POrtal, Ulo Selvagem, Meteora, Jolly Joker(PA), Delinqüentes(PA), Ant Corpus e Apaizana, além de todas as outras bandas.
Um grande abraço.
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O carnaval de Salvador virou festa para ricos. O pobre só tem direito de participar como cordeiro e o único bloco que cabe a ele é aquele bem famoso: bloco da limpeza!
É óbvio que deve haver as cordas, mas deveria ser estabelecido um preço máximo (de blocos) para esses empresários "gulosos".
Enfim, parabéns pelo blog.
Abraços,
Jennifer Emanuelle G. Sousa
(da Jorge Amado)